Quando
iniciei o doutorado em Regência Coral, na
Louisiana State University, em Baton Rouge, Estados Unidos da América, tive a
oportunidade de experimentar um momento único em minha caminhada pessoal e
profissional. Aqueles anos provocariam revoluções, seriam responsáveis por
mudanças radicais, verdadeiros divisores de águas, que afetariam o meu fazer/saber musical profundamente. Entre o encanto e o espanto,
vivi um enorme choque cultural já nos primeiros meses por conta do clima, da
comida, das relações interpessoais. A adaptação foi complexa e gerou desconforto
emocional, razão pela qual tive problemas psicossomáticos. Nessa mesma fase, muitos
questionamentos vieram à tona, especialmente no que diz respeito a minha práxis pedagógica.
Nos ensaios com o LSU A Cappella Choir, por exemplo, fiquei impressionado com o
repertório interpretado, a metodologia de trabalho, a sonoridade do conjunto,
que, muito embora formado majoritariamente por alunos da graduação e da pós em
canto, soava como um coro e não um grupo de solistas. O emprego do solfejo
móvel, as partituras editadas e comercializadas por empresas especializadas, a relação entre os músicos, bem como a
atitude colaborativa e proativa de todos os envolvidos naquele processo me
faziam pensar no Brasil, na nossa realidade, no meu dia-a-dia e de tantos outros
conjuntos e colegas.
Para
extravasar, resolvi, então, escrever e refletir sobre o que me incomodava,
sobre a minha responsabilidade ao voltar para o Brasil, ponto que já havia sido
tratado com o CNPq durante o trâmite para a concessão da bolsa de estudos. Assim,
o texto foi nascendo, na velocidade da minha ansiedade, resultando num artigo que foi publicado no site Piano Class, no Rio Grande do Sul. No texto, falo sobre a expansão do canto coral brasileiro,
ressaltando os aspectos positivos e negativos dessa ampliação. Discuto, entre
outros pontos, a relação entre música popular e erudita no repertório coral, a
criação de arranjos e o mercado editorial nacional. Trato também do imediatismo
que orienta as ações de muitos maestros, que priorizam o produto e não o
processo, isto é, as apresentações públicas em detrimento dos ensaios, e do
comportamento eminentemente bancário e passivo, usando a máxima Freiriana, que
predomina neste cenário.
Como já mencionado, o texto foi escrito há dezesseis anos e reflete
parte das minhas inquietações naquele período. Foi a partir daí que comecei a
repensar o meu cotidiano e a reconsiderar verdades arraigadas. Há poucos dias alguém
reencontrou esse material e me pediu permissão para publicá-lo novamente,
alegando que a temática continuava atual. Fiquei em dúvida, mas prossegui. Longe
de querer encerrar as discussões, espero que Mão e contramão: os (des) caminhos do canto coral brasileiro suscite o debate entre os colegas e nos faça rever
valores, os paradigmas da nossa filosofia coral.
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