A Cantata pra Alagamar, com texto de W. J. Solha e
música de José Alberto Kaplan, é uma obra para solistas, atores, coro misto e
orquestra de câmara, escrita em 1979, tendo como tema o conflito ocorrido na Fazenda
Alagamar, localizada entre os municípios de Salgado de São Félix e Itabaiana,
na Paraíba. A estreia aconteceu em junho daquele ano e obteve ampla aceitação do
público e da crítica. A primeira gravação (http://goo.gl/KjkuDZ),
realizada no mesmo período, foi regida pelo compositor.
José Alberto Kaplan dialoga com as formas setecentistas,
mantendo-se, ao mesmo tempo, em sintonia com a modernidade. Na Cantata
pra Alagamar, o tenor exerce o papel do evangelista, ligando seções, comentando o texto, refletindo sobre suas entrelinhas, rica em conotações
políticas. Com melodias nos modos lídio-mixolídio e amparado harmonicamente
pelo cravo, o tenor é simultaneamente profeta, cantador, repentista, aboiador,
revelando as conexões do compositor com a música de tradição oral do Nordeste.
O coco, o baião, o triângulo e a zabumba, empregados em momentos estratégicos
da narrativa, reiteram estes vínculos culturais. Os âmbitos vocais são
cômodos, tanto para os solistas quanto para o coro, e a formação camerística,
com poucos instrumentos, torna a obra acessível. A confluência de elementos universais e regionais,
velhos e novos, potencializa os conflitos entre tradição e ruptura, ditadura e
liberdade, tão acentuados na sociedade brasileira daquela época.
Participei da quinta série dos Concertos SESC
Partituras, quando ocorreu o lançamento da edição revisada da Cantata. Antes do
início do concerto, o maestro Carlos Anísio leu uma mensagem de Dom José Maria
Pires, Arcebispo da Emérito da Paraíba, e que à época participou do projeto: “A
Cantata é uma obra de arte realizada com coragem e muito amor. Coragem porque
vivíamos, então, o tempo da Ditadura e qualquer manifestação pública estava
sujeita à censura, de modo que a Cantata só pôde ser apresentada porque, para
isso, foi cedida uma de nossas igrejas. A Cantata foi não só obra de coragem,
mas sobretudo expressão de amor, um amor que ultrapassa fronteiras ideológicas
e religiosas. A realização da Cantata só foi possível graças a um trio composto
por um judeu, um ateu e um bispo. Num tempo de tanta violência, a Cantata vem
proclamar que todos devemos lutar para que, respeitada a liberdade de
pensamento de cada um, busquemos juntos transformar em convergências nossas
divergências, contribuindo assim para que o mundo vá deixando de ser um vale de
lágrimas e vá se aproximando da visão bíblica de um paraíso.”
A Cantata pra Alagamar é uma obra
representativa da literatura coral brasileira e a partitura completa está disponível gratuitamente no site do SESC (http://goo.gl/cYyXJu), podendo,
desta forma, ser interpretada por nossos grupos vocais e
instrumentais.
Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)
sexta-feira, 30 de maio de 2014
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Quem sou eu

- Vladimir Silva
- Sou paraibano, natural de Campina Grande. Fui seduzido pela arte, pela música e pela literatura há muito tempo. Atualmente, leciono nos cursos de graduação e pós-graduação em Música da UFCG e da UFPB. Sempre estou aqui e acolá, regendo e cantando, ensinando e aprendendo, ouvindo e contando histórias. Meu perfil profissional completo pode ser acessado na Plataforma Lattes (CNPq): http://lattes.cnpq.br/5912072788725094
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