domingo, 10 de abril de 2011

A feira

Sábado é dia de feira em Campina Grande. Pelas ruas da cidade, além dos campinenses, circulam aqueles que vivem no entorno da Rainha da Borborema, que se encontram para comprar e vender mercadorias, dinamizando a economia local. O trânsito fica ainda mais caótico, sobretudo onde se encontra o amplo e diversificado mercado central, que, como orgulhosamente dizem por aqui, é um dos maiores do Nordeste.
 
Na Vila Nova da Rainha, é possível encontrar uma grande variedade de plantas ornamentais, advindas do brejo paraibano e do agreste pernambucano. A policromia daquelas rosas e gérberas, sempre vivas, contrasta com a paisagem monocromática e inerte dos quiosques que vendem carnes e peixes. Ali, os animais eviscerados, decapitados e desossados espiam com os olhos semicerrados e bocas entreabertas, emitindo um grito silencioso, chamando a atenção para a fragilidade da condição humana, animal. Este emaranhado de gestos, olhares e odores seria o cenário perfeito para o nascimento de Jean-Baptiste Grenouille, personagem principal do filme Perfume – A história de um assassino, dirigido por Tom Tykwer.
 
Andando pelos becos e vielas, subindo e descendo ladeiras, ouve-se de tudo. De um lado ecoam os gritos dos vendedores e seus pregões, que Carl Orff, se ainda estivesse vivo e por aqui passasse, certamente os incluiria nos seus livros e métodos de educação musical. Do outro, o modalismo da cantoria de viola, do repente e do desafio que tanto fascinaram e influenciaram o compositor José Alberto Kaplan. Lá embaixo, na rua onde são comercializados pintos e galinhas e na qual, curiosamente, também estão localizados os bordéis, incluindo o que sobrou do Cassino Eldorado, o cabaré mais famoso e bem frequentado da cidade na primeira metade do século vinte, as radiolas tocam canções de amor de ontem e hoje.
 
A feira é um labirinto multisensorial, tablado de muitos conflitos, como mostrou Lourdes Ramalho na sua obra tragicômica, A Feira, já encenada diversas vezes no Brasil. Palco no qual brilharam Maria Pororoca, Carminha Vilar e Zefa Tributino, as damas do conhecido Eldorado, todas imortalizadas no Forró em Campina, de Jackson do Pandeiro, aquele ambiente mercantil evoca as práticas comerciais da Idade Moderna, o universo musical renascentista francês, a polifonia imitativa e descritiva da canção Les cris de Paris, de Clement Janequin. Assim como nA Feira de Caruaru, enaltecida pela dupla Onildo Almeida e Luiz Gonzaga, na feira de Campina, grande e sui generis como ela o é, “de tudo que há no mundo, nela tem pra vender.” Entre balaios, cores, aromas e sabores, a vida, livre como o mercado a céu aberto, é puro movimento, festa e fantasia nesta Feira de mangai, que em cada canto de rua tem um sanfoneiro fazendo floreio pra gente dançar.
 
Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)

2 comentários:

vitoria mota disse...

Vladimir, seu texto me trouxe à memória, a feira de Campina Grande, a Vila Nova da Rainha, enfim a cidade ali traduzida. E que prazer e satisfação poder rememorar um tempo tão feliz através do seu texto.
Obrigada por partilhar essa lembrança com seus leitores.

Anônimo disse...

professor vladmir ao ler seu escrito sobre a feira veio me na memória a lembrança de quando eu era criança ,minha mãe sempre me levava com ela pra fazer compras,nós andavamos tanto,eu sempre com uma sacolinha cheia,todo sábado era sagrado ir a feira,eu não gostava muito,mais tinha que ir era a irmã mais velha...Vejo que a feira continua com sua essência...DE TUDO TEM..DE TUDO HÁ....GENTE PRA LÁ GENTE PRA CÁ.
UM ABRAÇO Ass ANA PAULA PEREIRA

Postar um comentário