Fim de semana, na minha infância, era sinônimo de muita música. Todos os sábados, eu e meus amigos passávamos a tarde tocando flauta e violão. Empolgados, não sentíamos o tempo passar e só quando ouvíamos o badalar do sino da Capela João Moura, avisando que a missa das cinco estava para começar, que decidíamos parar. Eu saia às pressas, correndo ao encontro da minha tia-avó, Maria Ferreira, para juntos seguirmos até a igreja. Durante a celebração, esperava com certa ansiedade a hora dos cânticos, que eram anunciados nos primeiros acordes da pequena e nasalada serafina que Irmã Aldete, a madre superiora, dominava com maestria. Maria se orgulhava quando me (ou)via cantando com empolgação.
No domingo pela manhã, eu sempre acordava cedo para ouvir a Campina FM e o programa Clássicos Eternos, apresentado por Hilton Mota. Cada semana a temática era variada. E foi assim que gradualmente fui conhecendo a literatura musical de diferentes períodos, autores e estilos, o que só aumentava o meu interesse pela música. (Eu nem imaginava que, anos mais tarde, seria o produtor e apresentador deste mesmo programa.) Em casa, após o almoço, nos divertíamos, eu e a minha irmã mais velha, com o programa Qual é a música?, no qual Sílvio Santos desafiava os participantes com uma gincana musical.
Meu pai também gostava deste jogo. Contudo, preferia ouvir suas músicas, especialmente depois que adquiriu um “três-em-um”, o aparelho de som mais moderno da época. (Este equipamento permitia ler e gravar fitas cassete, sintonizar rádio AM e FM e escutar discos de vinil.) Comumente, ele colocava na bandeja Gal Tropical, Ave de Prata, o primeiro trabalho que Elba Ramalho gravou, e a Arte de Chico Buarque, que ouvíamos deitados no chão duro, frio e de cimento avermelhado, porém aconchegante, da sala da nossa casa. Curiosamente, meu irmão caçula gostava de ouvir Chico Buarque cantando Minha história e falando da pobre mulher que, por não se lembrar de acalantos, o ninava cantando cantigas de cabaré. E ele sorria e pedia para meu pai repetir várias vezes aquele laiá, laiá.
Anos depois, já no início da adolescência, no fim da tarde, quando no alto da Rua das Imbiras os portões da AABB se abriam, avisando que a matinê estava encerrando, corríamos para aproveitar o que restava da festa. Enquanto meus amigos se dirigiam para o salão, onde dançavam e se divertiam, eu me apressava para ficar na lateral do palco, vendo e ouvindo os artistas, grupos que (en)cantavam, como, por exemplo, os Vikings, Som Livre, Ogírio Cavalcante e Trepidants. Hoje é domingo e, como na conhecida canção, lembrei-me, com saudade, daquelas jovens tardes, tantas alegrias, velhos tempos, belos dias.
Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)
domingo, 3 de outubro de 2010
Search
Quem sou eu

- Vladimir Silva
- Sou paraibano, natural de Campina Grande. Fui seduzido pela arte, pela música e pela literatura há muito tempo. Atualmente, leciono nos cursos de graduação e pós-graduação em Música da UFCG e da UFPB. Sempre estou aqui e acolá, regendo e cantando, ensinando e aprendendo, ouvindo e contando histórias. Meu perfil profissional completo pode ser acessado na Plataforma Lattes (CNPq): http://lattes.cnpq.br/5912072788725094
2 comentários:
Creeedo, que dejà-vu... eu também adorava "Minha história". Recordar é viver duas vezes, até pra nós que viemos "do século passado", como diria a poetisa goiana.
Abraço.
Angelo (GO)
Belo texto, Vladimir! Me fez recordar mtas coisas parecidas das antigas tardes de domingo. Mto bom poder reviver tudo isso!!
saudades!
Vitória
Postar um comentário